Mais um momento de poesia:
E é desta forma que a nossa poetisa nos mima...
Maria Fael
Humedeço no teu lençol de areia,
Aqueço com os teus raios de sol,
Arrefeço no teu manto de água,
Salgo o meu corpo no teu sal.
Adormeço nos teus socalcos macios,
Longe dos gentios, do buliço, reboliço!
Me banho numa espuma revoltosa,
Num mergulho profundo, e num segundo
Submerjo de cara lavada, alma enlevada
A ti, praia da minha vida!
Maria, maio, 2019
Mentira na tua boca é metáfora
Metáfora na tua frase é fantasia
Fantasia na tua vida é alegria
Alegria na alma é alimento
Alimento é sustento de corpos
Corpos escolhem a união
União de bens em comunhão
Comunhão na vida e na morte
Morte é hipérbole na personificação
Da flor que desabrocha sem amor
Numa mentira de dor!
Maria, abril 2019
Mãe Soberana
Domingo, dia da Mãe, para quem a
tem nos seus braços a retém, para quem não tem, saudades dela mantém!
O dia prometia, praia, sol, banho
em água límpida e uma tarde consagrada à Mãe Soberana, Nª Senhora da Piedade,
Padroeira de Loulé.
Almoço em família, primos, casa,
gatos, bom vinho e umas papas beirãs, compuseram a refeição em perfeita
harmonia, em paz!
Não podíamos comer muito, para
nós o caminho não era difícil, mas era longo. Ver o cortejo e acompanhar o
andor da Mãe Soberana ao alto da sua capelinha no monte, na cidade, Loulé.
A tarde foi generosa, o sol
brilhava, o povo corria apressado, entrava na tasca, bebia a cerveja que o
calor apertava, o fresco sabia bem, refrescava. O povo gargalhava, fotografava,
exibia-se, o melhor fato, sapato de salto alto, rendas, cores. O menino
chorava, embalava-se, dormia com alegria! Seguem o percurso, o povo em apoio
com grande vigor aos homens do andor.
Começa o cortejo, desfilam belos
cavalos, sublimes, agitados, acólitos e padres em passo apressado antecedem o
andor, não há tempo a perder, muito há ainda que percorrer. Nossa Senhora da
Piedade, do alto, olha o povo em compaixão com Cristo no seu colo prostrado.
Rodeada de flores brancas, pequenas e da talha dourada, manto bordado a fio de
ouro, a todos nos benze com orgulho ferido de Mãe avassalada com a morte do Seu
filho. A filarmónica de gente suada vai tocando, notas altas de alegria,
tristeza arredia. Vozes gritam: “Viva a Mãe Soberana”. O povo responde “Viva”!
Percorre as artérias da cidade em
caminho ao monte, mais uma bebida que o corpo aquece e é preciso energia para a
subida. O povo aglomera-se, os leques abanam-se nas bancadas, repletas,
completas. Vamos caminhando em passo apressado. O caminho íngreme, empedrado do
monte clama com calor. Não tarda, o andor.
Posicionem-se, cheguem-se para
trás, vozes avisadas, experientes no evento, gritam aos mais incautos e
amadores. O cortejo vem sem parança, sem fôlego, não pode parar é sempre a
andar, a abrir. O povo que se arrede que a Santa quer florir em capela colocada
e adorada.
Ouvem-se os gritos mais perto,
vivas à Mãe Soberana. O povo vem descomposto, choroso, rostos em desespero,
afogueados, olhos marejados, em braços são empurrados pelos mais fortes que sem
olhar, mas sabendo o caminho, pisam cada pedra como se a conhecessem. O padre é
ovacionado, ri com alegria, esconde o cansaço que a batina denuncia.
Os homens do andor, suados,
cansados, não olham de lado, forçam os corpos tombados de dor com o peso do
andor. A Senhora, imponente, reza por todos, culpado, inocente entra nas suas
Graças. A banda mantém o ritmo acelerado até ao fim, não dá tréguas aquele
caminho empedrado e a música não perde o tom afinado.
Mãe Soberana chega à capelinha em
ovação:” Viva a Mãe Soberana”, “Viva”; “Viva Nossa Senhora da Piedade”, “Viva”!
O padre bota faladura a um povo que abana seus lenços brancos num adeus
profundo à sua Santa.
A nova capela está vazia, poucos
são os devotos de Maria. Quem reza, fica, quem não reza procura a barraca, o
cheiro é intenso, bifana, bebida, festejos de quem prometia e assim cumpria
mais um dia.
Repousa a Senhora depois de mais
um cortejo oferecido ao povo. Há que regressar, assistir ao acabar do evento
domingueiro e vai o povo ordeiro à cidade marchar para ver o terminar do
momento derradeiro: o despedir dos homens do andor que seus panos azuis e
brancos agitam em alegria com sons musicais de romaria.
Um último desfilar se alinha,
cansadas, mas concentradas as majoretes de trajes contrastantes, compostos,
marcham ao ponto de partida com dever cumprido e assumido, abrilhantar um
cortejo abençoado, idolatrado pelo povo.
Pedidos futuros, promessas cumpridas num mundo
melhor, rogadas aos pés de um andor transportado com vigor, Mãe Soberana a
Padroeira de Loulé a Quarteira!
Maria, maio, 2019