À SUA ATENÇÃO
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Notícia do Público - http://www.publico.pt/
Mais de 70% dos jovens portugueses com sinais de dependência da Internet
Estudo do ISPA mostra também que 13% dos casos são graves, podendo implicar isolamento e comportamentos violentos.
Este é o retrato de uma geração que vive quase permanentemente
ligada. Através dos computadores ou dos dispositivos móveis, os jovens e
adolescentes nacionais passam muito do seu tempo na Internet. Um tempo
excessivo em muitos casos. Um estudo do ISPA mostra que quase três quartos da
população até aos 25 anos apresenta sinais de dependência do mundo digital. Em
casos mais extremos, o vício do online pode implicar isolamento, comportamentos
violentos e obrigar a tratamento.
“Percebemos que a
dependência da Internet é generalizada”, sintetiza a investigadora da Unidade
de Intervenção em Psicologia do ISPA – Instituto Universitário, Ivone Patrão,
coordenadora deste estudo. Nos últimos dois anos, este trabalho passou por três
fases de aplicação de questionários junto de jovens e adolescentes dos 14 aos
25 anos, envolvendo quase 900 inquiridos. Esta é, portanto, uma imagem com
grande angular do que está a acontecer em muitas casas.
Os exemplos recolhidos pelo
PÚBLICO corroboram os resultados da investigação. Quase todos os casos
partilham também o pedido para que seja mantida a reserva da identidade dos
jovens envolvidos. As histórias repetem-se, porém, e soam familiares aos
pais. Alguns adolescentes deixam para trás um percurso académico de bom
nível para se fecharem no quarto a jogar computador dia e noite. Há amizades de
infância que são postas de lado em detrimento do contacto online. O isolamento
em relação à família, as mudanças de comportamento, os casos de violência
inexplicável face ao insucesso num jogo digital ou à proibição de continuar
ligado são outros comportamentos comuns
Os investigadores do ISPA
também enumeram alguns componentes-chave para identificar os casos de
dependência da Internet numa espécie de retrato-tipo do jovem viciado no mundo
online: grau elevado de importância conferido ao computador ou aos dispositivos
móveis; sintomas de tolerância face ao uso; sintomas de abstinência face ao não
uso (como irritabilidade, dores de cabeça, agitação e por vezes agressividade)
e, em casos mais extremos, recaída face às tentativas sucessivas para parar.
Os números a que chegou a
equipa de Ivone Patrão no ISPA dão uma outra camada de leitura desta realidade.
Há quase três quartos (73,3%) dos jovens que apresentam sintomas de viciação na
Internet. Destes, 13% exibem níveis severos de dependência, que se manifestam
através dos comportamentos mais extremos descritos pelos pais e referidos pelos
investigadores. Os próprios jovens parecem ter noção disto, uma vez que mais de
metade (52,1%) dos inquiridos se percepciona como “dependentes da Internet”.
Maioria frequenta o
secundário
Os investigadores do ISPA chegaram também a outro retrato-tipo: os jovens dependentes são sobretudo do sexo masculino, não têm relacionamento amoroso e frequentam o ensino secundário. Este foi um dos primeiros resultados a que a equipa da Unidade de Intervenção em Psicologia chegou, em 2012, quando aplicou um primeiro questionário – desenvolvido pela Nottingham Trent University, que é parceira deste trabalho – de modo a validá-lo para a realidade portuguesa. As conclusões iniciais motivaram a continuação da investigação nas duas fases seguintes, que agora são divulgadas publicamente.
Os investigadores do ISPA chegaram também a outro retrato-tipo: os jovens dependentes são sobretudo do sexo masculino, não têm relacionamento amoroso e frequentam o ensino secundário. Este foi um dos primeiros resultados a que a equipa da Unidade de Intervenção em Psicologia chegou, em 2012, quando aplicou um primeiro questionário – desenvolvido pela Nottingham Trent University, que é parceira deste trabalho – de modo a validá-lo para a realidade portuguesa. As conclusões iniciais motivaram a continuação da investigação nas duas fases seguintes, que agora são divulgadas publicamente.
Outros estudos recentes
confirmam os sinais de uma geração cada vez mais dependente da tecnologia,
levando mesmo a situações-limite em que “é posto em causa o bem-estar físico” dos
jovens e adolescentes, conta a investigadora da Faculdade de Ciências Sociais
da Universidade Nova de Lisboa Cristina Ponte, que liderou os projectos EU Kids
Online e, mais recentemente, Net Children Go Mobile.
Neste último trabalho,
cujos resultados nacionais serão discutidos numa conferência no final do mês,
6% dos jovens admitem ter ficado “sem comer ou sem dormir por causa da
Internet”, por exemplo. "Há uma pressão para estarem sempre ligados”,
avalia esta especialista. Na sua investigação recolheu exemplos que atestam
esta situação, como a de um menino de 12 anos que contava, por entre risos, que
no smartphone e
no tablet nunca
se fica offline, por causa dos sinais sonoros com os alertas para as
actualizações no email ou nas redes sociais. O rapaz dava também conta da forma
como os amigos ficavam zangados se ele não respondesse rapidamente a alguma
mensagem, por exemplo, mesmo no horário em que devia estar a dormir.
“Os jovens estão a usar
demasiado as tecnologias. Quase minuto a minuto”, confirma Rosário Carmona,
psicóloga, que tem tratado casos de dependência da Internet no Centro de Apoio
ao Desenvolvimento Infantil (Cadin), em Cascais. “Quando lhes pergunto se já
foram ao email hoje, eles riem-se. Não foram ao email, porque não saíram do
email”, descreve.
Rosário Carmona tem lidado
com os casos mais patológicos de dependência do mundo online, aqueles em que “a
utilização da Internet se sobrepõe a outras dimensões da vida” e que estão
sobretudo associados aos jogosmultiplayer.
“É um ciclo vicioso”, expõe. O jovem tem dificuldades em fazer amigos e por
isso joga muito tempo. Torna-se cada vez melhor no jogo e prefere ficar em casa
a jogar, em vez de sair para estar com amigos, a família ou mesmo ir à escola.
“Todos procuramos aquelas situações em que somos mais competentes”, explica a
psicóloga.
Dependência associada a
depressão
Uma das principais conclusões a que chegou a equipa do ISPA no seu estudo sobre os usos da Internet foi a de que os jovens que apresentam sinais de dependência do mundo online têm também sintomas de isolamento e, por vezes, de depressão. Entre os inquiridos do estudo do ISPA que revelam sinais de dependência, quase um quarto (22,1%) apresenta elevados níveis de isolamento social. “Esta dependência está associada ao isolamento social, mas não está associada ao isolamento emocional”, adverte, porém, Ivone Patrão, coordenadora deste trabalho.
Uma das principais conclusões a que chegou a equipa do ISPA no seu estudo sobre os usos da Internet foi a de que os jovens que apresentam sinais de dependência do mundo online têm também sintomas de isolamento e, por vezes, de depressão. Entre os inquiridos do estudo do ISPA que revelam sinais de dependência, quase um quarto (22,1%) apresenta elevados níveis de isolamento social. “Esta dependência está associada ao isolamento social, mas não está associada ao isolamento emocional”, adverte, porém, Ivone Patrão, coordenadora deste trabalho.
Estes são jovens isolados,
mas que encontram nas conversas e nos encontros online “um escape”. Esta é,
portanto, uma dependência que “traz uma mais-valia”, ainda que do ponto de
vista psicológico não seja saudável, expõe a mesma especialista. “O desafio da
adolescência é sair do núcleo familiar e passar o foco para o mundo social. Na
Internet, tudo isto é mais fácil”, acrescenta Rosário Carmona, da Cadin. Os
jovens têm a sensação de satisfazer online as suas necessidades de contacto
social. A psicóloga encontra também entre os dependentes do mundo virtual
com quem costuma lidar sintomas de isolamento ou depressão
“Na prática clínica,
estamos a perceber que a dependência não é causa, mas consequência”, diz.
Quando um adolescente fica deprimido, por força de algum episódio escolar ou
familiar, por exemplo, está a conseguir encontrar nas novas tecnologias um
refúgio.
Por isso, a especialista
não é apologista da solução mais comumente encontrada pelos pais para responder
ao uso excessivo do computador pelos filhos e que é fruto de tensões
familiares: retirar o computador ou limitar fortemente o acesso a ele. “O uso
excessivo da Internet está a suprir uma outra necessidade do jovem. Se lhe
tiramos o computador, ele fica no vazio. É preciso fazê-lo ganhar o gosto por
actividades alternativas, antes de diminuir o tempo online”, defende a
psicóloga, que, recentemente, fez um estágio num centro especializado no
tratamento de casos de dependência em Seul. Na Coreia do Sul, o problema tomou
tal dimensão que o Ministério da Educação já promove a identificação precoce de
crianças e jovens em risco e a realização de programas de prevenção.
Intervenção de prevenção
Por cá ainda não há nenhuma iniciativa do género. Esta é “uma área emergente”, classifica Ivone Patrão do ISPA, em que “importa intervir do ponto de vista preventivo”. “Temos cada fez mais pessoas com acesso a computador e na experiência clínica percebo que cada vez mais os adolescentes estão entregues a si próprios no uso do computador. Há uma necessidade de educar os jovens para a forma como podem fazer um uso saudável destes dispositivos”, propõe a investigadora.
Por cá ainda não há nenhuma iniciativa do género. Esta é “uma área emergente”, classifica Ivone Patrão do ISPA, em que “importa intervir do ponto de vista preventivo”. “Temos cada fez mais pessoas com acesso a computador e na experiência clínica percebo que cada vez mais os adolescentes estão entregues a si próprios no uso do computador. Há uma necessidade de educar os jovens para a forma como podem fazer um uso saudável destes dispositivos”, propõe a investigadora.
A dependência da Internet é
considerada uma dependência comportamental, sem substância. “As consultas que
existem destinam-se a dependências de substâncias, como o álcool e as drogas”,
explica Ivone Patrão, alertando para as limitações destas terapêuticas. O passo
seguinte da investigação do ISPA passará, por isso, pelo desenvolvimento de
formas de intervenção e terapêuticas para contrariar o vício do online nos
jovens em Portugal. Noutros países, estão a ser dados passos na
farmacologia, no sentido de desenvolver novas drogas que actuem sobre estes
casos específicos.
Esta discussão foi
alimentada pela nova edição do Manual de Diagnóstico das Doenças Mentais
(DSM-V), lançada pela Associação Americana de Psiquiatria no ano passado, que
inclui um anexo em que é recomendado o estudo e a compreensão dos
critérios de diagnósticos das dependências comportamentais como as dos jogos e
da Internet. Em Portugal, o Plano Nacional dos Comportamentos Aditivos e das
Dependências 2013-2020, aprovado na semana passada pelo Conselho de Ministros,
prevê o alargamento da área de intervenção do Serviço de Intervenção nos
Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) às dependências sem
substância como o jogo ou a Internet.
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