in: https://www.publico.pt/autor/sergio-anibal
O economista que
“tornou a ciência económica mais humana”
O prémio Nobel de 2017 foi para um
norte-americano que tem vindo a mostrar que apenas em modelos os agentes
económicos são totalmente racionais.
10 de
Outubro de 2017, 0:00
Richard Thaler é visto com dos pais da
economia comportamental
REUTERS/KAMIL KRZACZYNSKI
Richard Thaler, acabado de saber que o prémio Nobel da Economia de 2017 era
seu, explicou de forma sucinta aos jornalistas o que é que o seu trabalho das
últimas três décadas tinha trazido de diferente para o estudo da economia: “foi
o reconhecimento de que os agentes económicos são humanos e que os modelos
económicos têm de incorporar isso”.
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A primeira ideia, a de que “os agentes económicos são humanos”, parece ser
uma ideia básica e óbvia, algo que está à vista de toda a gente e que não seria
suficiente para ganhar grandes prémios. Mas a verdade é que, na ciência
económica clássica, os modelos utilizados para fazer previsões sobre como a
economia se irá comportar assumem, por questões práticas e de simplificação,
que ao tomarem as suas decisões os agentes económicos agem sempre para
maximizar seu interesse próprio e são calculistas e totalmente racionais. Isto
é, muito pouco humanos.
Foi na tentativa de contrariar esta escassez do factor humano nos modelos,
responsável por tantas falhas de previsões, que se desenvolveu a chamada
economia comportamental. Ao contrário da economia clássica, este campo de
estudo assume que algumas decisões – sejam de uma pessoa individualmente ou de
uma empresa ou do Estado - pouco ou nada têm de racional. E que, por isso, é
importante que se consiga, com recurso a outras ciências como a psicologia,
encontrar explicações para a falta de racionalidade, para que se possa
eventualmente passar a antecipar melhor como se comportam realmente as
economias.
Richard Thaler, um economista norte-americano de 72 anos de idade, há muito
que é visto como um dos pais fundadores da economia comportamental e, esta
segunda-feira, a Academia Real Sueca das Ciências decidiu premiá-lo por isso,
atribuindo-lhe o Prémio do Banco da Suécia para as Ciências Económicas em
Memória de Alfred Nobel, mais conhecido como Prémio Nobel da Economia.
Desde os anos 80 do século passado que Thaler, actualmente professor na
Universidade de Chicago, começou a mostrar como as decisões económicas, tanto
vistas individualmente como a um nível mais macro, são tomadas muitas vezes
relegando a racionalidade para um segundo plano e dando prioridade a emoções e
sentimentos vários. Através de exemplos e de dados concretos, tornou claro que
as pessoas pura e simplesmente não se comportam da forma como a teoria económica
poderia fazer supor.
As pessoas dão valor a questões como a justiça. E estão dispostas a ser
elas próprias penalizadas se se depararem com alguma coisa que consideram
injustas. Se um vendedor de chapéus-de-chuva tentar aproveitar-se do facto de
estar a chover torrencialmente para vender cada chapéu ao dobro ou ao triplo do
preço, pode deparar-se com compradores que, numa análise racional poderiam
considerar o preço justo, mas que, respondendo ao sentimento de injustiça, o
forçam a redefinir os preços.
As pessoas têm problemas em controlar-se a elas próprias. E sentem
necessidade de, logo à partida, comprometerem-se com um determinado tipo de
comportamento, mesmo que ele venha a revelar-se, a certa altura, como pouco
racional.
As pessoas têm estados de espírito diferentes em diferentes fases das suas
vidas. E tomam decisões de acordo com aquelas que são as suas prioridades no
momento. Algumas vezes mais a pensar no futuro, outras mais a pensar no
presente.
As pessoas têm medo de se arrepender. E por isso, algumas vezes, mesmo que
haja um caminho que seja mais lógico do que outro, preferem não tomar qualquer
decisão, para não correrem o risco de errar.
As pessoas são dadas a euforias. Quando as coisas começam a correr bem,
pode existir a tendência para pensar que tudo vai correr sempre bem. Richard
Thaler foi chamado a mostrar isso numa breve aparição no filme “A Queda de Wall
Street” (“The Big Short” no título original), em que surge ao lado de Selena
Gomez, a explicar como é que um investidor, um apostador ou mesmo um jogador de
basket tendem a acreditar, quando são bem sucedidos nas suas primeiras
tentativas (investimento, aposta ou lançamento ao cesto), que tudo vai
continuar a ser igual no futuro, persistindo em novas tentativas para além do
que seria racional e conduzindo em alguns casos a perdas de grande dimensão.
Como as pessoas são tudo isto - ao mesmo tempo que tentam também ser
racionais - desenhar modelos económicos que sejam certeiros e exequíveis
torna-se uma tarefa extremamente difícil. Talvez por isso, Richard Thaler
dedicou-se nos últimos anos a estudar de que forma é que é possível dar
incentivos às pessoas para que estas se comportarem de determinada maneira. É
aquilo a que chamou, num livro escrito em conjunto com Cass Sunstein em 2008, a
“teoria Nudge”, uma espécie de pequeno empurrão que pode ser dado aos agentes
económicos quando se pretende, por exemplo, reduzir o consumo de um determinado
bem ou aumentar o nível da poupança.
Esta segunda-feira, em Estocolmo, os responsáveis da Academia Real Sueca
das Ciências não pouparam na hora de medir o impacto do contributo de Richard
Thaler: disseram que permitiu uma maior “compreensão da psicologia da
economia”, que ajudou a economia comportamental a "passar da margem para o
centro" da ciência económica e, principalmente, que “tornou a ciência
económica mais humana”.
Richard Thaler, por seu lado, agora que faz parte da elite de economistas
que receberam um Nobel, prometeu também ele continuar humano. Quando
questionado sobre o que pretendia fazer ao prémio de nove milhões de coroas
suecas que tinha acabado de receber, disse que iria tentar gastá-lo “o mais
irracionalmente possível”.