Adolescentes portugueses sentem-se mal quando não têm
Internet por perto
Estudo
da OCDE diz que jovens que têm um uso extremo da Internet mostram-se menos
satisfeitos com a vida e têm também desempenhos académicos piores.
19 de Abril
de 2017, 10:09 actualizado a 19 de Abril às 13:47
o
A satisfação com a vida, a relação com
os pais e com a escola também foram avaliadas JOANA BOURGARD
Portugal é dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Económico (OCDE) onde existe uma maior percentagem de jovens de 15 anos a
afirmar que se sentem mal quando não têm disponível uma ligação à Internet. São
mais de 77% os que o afirmam, quando a média na OCDE é de 54%.
Acompanham Portugal naquele pelotão a França, Grécia, Suécia e Taipé,
segundo revelam os resultados dos inquéritos efectuados aos alunos que
realizaram os testes PISA em 2015, divulgados nesta quarta-feira de manhã num
relatório da OCDE sobre o bem-estar dos jovens.
Os testes PISA, que são promovidos pela OCDE, realizam-se de três em três
anos para aaferir
a literacia a leitura, matemática e ciências dos alunos com 15 anos de idade.
Apesar da aparente dependência dos alunos portugueses face à Internet, o
tempo em que estes dizem estar online durante os dias da
semana (140 minutos) está ligeiramente abaixo da média da OCDE (146). Ao fim de
semana a situação inverte-se: os alunos portugueses passam 190 minutos na Net
contra uma média de 184 minutos na OCDE.
Margarida Gaspar de Matos, coordenadora em Portugal do grande estudo
sobre a adolescência promovido, de quatro em quatro anos, pela Organização
Mundial de Saúde(Health Behaviour in School-Aged Children),
confirma que Portugal se tem “evidenciado” no uso da Internet, desde 2010, mas
alerta que não se deve confundir “o abuso do uso” com “dependência”.
“A dependência da Internet tem um critério clínico de diagnóstico que
transcende as horas passadas” online, adianta. Mas o abuso tem
também consequências “uma vez que traz associado problemas de saúde física,
nomeadamente higiene do sono, problemas sensoriais, de alimentação, de
sedentarismo e psico-sociais”, alerta.
A investigadora salienta, contudo, que não se deve esquecer que “o acesso e
uso da Internet é um avanço civilizacional que inclui acesso à informação,
gestão do trabalho, comunicação e recreação”.
“São três realidades diferentes e baralhá-las não ajuda a compreender a
situação. Deve-se aproveitar os pontos positivos, que são muitos, e tentar
limitar os problemas”, conclui.
Quase 90% dos jovens inquiridos na OCDE concordam que a Internet “é um
óptimo recurso para obter informação” e 84% consideraram que as redes sociais
“são muito úteis”. Na generalidade, a primeira afirmação foi mais apontada por
estudantes de meios socioeconómico favorecidos do que pela dos oriundos de
meios carenciados. Mas Portugal tem, também aqui, um lugar de destaque: o fosso
entre os dois grupos não chega aos cinco pontos percentuais. Há poucas
diferenças entre ambos. Dinamarca, Islândia e Macau alinham com Portugal neste
grupo. Já no México a diferença entre os dois grupos é de 20 pontos
percentuais.
No geral, o uso da Internet “pode aumentar a satisfação com a vida por
propiciar entretenimento e retirar obstáculos à socialização”, mas também pode
ser uma fonte de riscos ao bem-estar dos jovens, alerta-se no relatório. Por
exemplo, os jovens que têm um uso extremo da Internet mostram-se menos
satisfeitos com a vida e têm também desempenhos académicos piores.
Satisfeitos com a vida
Saber se os estudantes estão satisfeitos com a sua vida foi um dos
objectivos do inquérito realizado. Numa escala de 0 a 10, em que 0 corresponde
à pior vida possível e 10 à melhor, em média os alunos da OCDE apontaram para
um valor de 7,3.
Em Portugal o lugar nesta escala é de 7,36. No valor mais alto da escala,
estão 31% dos alunos portugueses, que dizem estar muito satisfeitos com a vida
(34,1% na OCDE) e na posição oposto existem 8,9%, cerca de três pontos
percentuais abaixo da média.
Mas a satisfação com a vida está também marcada pelo género: no conjunto
dos países da OCDE, existem 39% de rapazes de 15 anos que se dizem muito
satisfeitos com a vida, um valor que baixa para os 29% quando são as raparigas
a falar. Em Portugal o fosso entre os dois grupos é idêntico (35,6% para os
rapazes e 26,3% para as raparigas).
Uma das conclusões a que a OCDE chegou é a de que a relação entre
satisfação com vida e o desempenho escolar é fraca. Já o ambiente em que os
estudantes aprendem e se desenvolvem têm peso na satisfação com a vida. E aqui,
frisa-se, os professores têm um “papel particularmente importante”:
“Os estudantes mais felizes tendem a dar conta de uma relação positiva com os
seus professores.”
Também os pais têm aqui um papel a desempenhar. Os estudantes cujos pais
passam tempo a falar com eles, que comem uma refeição em conjunto ou debatem o
modo como o filho se está a sair da escola têm uma probabilidade maior de terem
maiores níveis de satisfação com a vida.
Portugal aparece, também aqui, em destaque com 90% dos alunos a dizerem que
comem pelo menos uma refeição em conjunto com os pais contra uma média de 82%
na OCDE. E 92% dos alunos portugueses também dizem que os pais têm o hábito de
falar com eles depois da escola, um valor igualmente superior à média da OCDE
(86,1%).
Ir mais longe
A motivação dos alunos em ir mais longe é outro factor preditor de uma
maior satisfação com a vida, frisa a OCDE. Aos 15 anos, 44% dos alunos da
organização dizem querer completar um curso universitário. Em Portugal são
menos: 39,9%.
Em todos os países, os estudantes mais carenciados tendem a ter
expectativas mais baixas do que os seus colegas de meios favorecidos no que
toca à conclusão do ensino superior. Mas há países piores do que outros e
Portugal sai-se mal do retrato, com um fosso de 50 pontos percentuais a separar
as expectativas dos dois grupos. Na OCDE este valor ronda os 40 pontos
percentuais.
Se o sentimento de pertença à escola é nestas idades um dos factores que
mais conta para se estar satisfeito com a vida, e a maioria está nesta
situação, também se podem viver ali experiências devastadoras. O bullying é
uma delas.
O melhor do Público no
email
Subscreva gratuitamente as newsletters e
receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público.
No conjunto dos países da OCDE, cerca de 11% dos estudantes diz-se alvo de
gozo, 7% afirmam que são postos à parte e 8% contam que são objecto de boatos
maldosos.
A violência física repetida é reportada por 4% dos alunos. No conjunto,
18,7% dizem-se vítimas de um qualquer acto debullying, um valor que em
Portugal desce para 11,8%.
Os resultados dos inquéritos mostram que os rapazes têm maior probabilidade
de serem vítimas do que as raparigas, embora estas tenham maior peso se o que
está em causa é ser posto de parte ou ser objecto de boatos maldosos. Por outro
lado, os estudantes com piores desempenhos estão mais expostos a agressões
verbais físicas e psicológicas do que os seus colegas mais bem-sucedidos.
Sem comentários:
Enviar um comentário