Não é mito: a
utilização de ecrãs afecta (e muito) a visão
A utilização intensiva de dispositivos electrónicos está a afectar a saúde
dos nossos olhos e as consequências já se fazem sentir. O especialista António
Morais alerta para o problema e ajuda a evitá-lo.
18 de Março de 2019, 13:12
GETTY
Os
dispositivos electrónicos tomaram conta da nossa vida e não conseguimos
simplesmente deixar de os utilizar, mas o seu uso intensivo deixa marcas nos
nossos olhos, com eventuais consequências graves. Referimo-nos aos ecrãs de
dispositivos electrónicos – como telemóveis, tablets ou
computadores – cuja utilização frequente pode afectar a saúde ocular. E não,
isto não é mito, havendo cada vez mais produção científica sobre a síndrome da
visão do computador (SVC) - nome atribuído a este problema de saúde, que pode
atingir quem passa muitas horas com os olhos postos num ecrã, independentemente
da idade.
De
acordo com António Morais, especialista em optometria da Alberto
Oculista, “a SVC afecta já milhões de pessoas em todo o mundo, com
grandes perspectivas de aumentar ainda mais, fruto do excessivo uso do
computador e semelhantes”. Nas suas palavras, esta situação “pode ser
considerada uma doença, que irá quase de certeza atingir uma grande percentagem
da população que utiliza mais de duas a três horas diárias um ecrã digital”.
Com efeito, Sheppard e Wolffsohn, autores de um estudo publicado no ano passado
na BMJ Open Ophtalmology, estimam que cerca de 50% ou mais dos
utilizadores de computadores possam sofrer de SVC.
Como surge a SVC?
Segundo
o optometrista: “quando estamos à frente de um ecrã, os olhos estão
constantemente a focar a diferentes distâncias curtas, por exemplo, passando do
monitor para a secretária e vice-versa, ou seguindo frases e reagindo a
diferentes estímulos de imagens”. Uma vez que todas estas operações são
habitualmente realizadas a menos de um metro de distância, acabam por ser muito
exigentes: “Exigem um esforço do sistema visual para seguimento e acomodação,
bem como do cérebro para interpretar os vários estímulos.” “Tudo isto seria
normal para o ser humano se não fosse efectuado durante tantas horas seguidas”,
explica.
Alguns sintomas da SVC
- Visão desfocada
- Olhos secos e vermelhos
- Irritação e cansaço ocular
- Dores de cabeça
Consulte a infografia no final para saber mais.
A piorar
a situação está o facto de “haver uma forte possibilidade de estas pessoas
terem algum tipo de problema visual não corrigido, como astigmatismo,
hipermetropia, presbiopia ou problemas acomodativos e de convergência”. Além
disso, muita gente utiliza os dispositivos e computadores sem ter em conta a
luz ambiente, o brilho do ecrã, a distância a que o faz e a má postura que
adopta, pelo que “a situação complica-se ainda mais”, salienta.
Os perigos da luz azul
Um dos
aspectos que pode contribuir para o surgimento de problemas visuais como
consequência da utilização de ecrãs é a luz azul que estes emanam. O
optometrista da Alberto Oculista explica que “esta é uma componente da luz que
encontramos no sol, ecrãs digitais, luzes fluorescentes e até luzes led,
sendo que os nossos olhos não possuem um filtro capaz de bloqueá-la ou
reflecti-la”. Assim, quanto mais precocemente se começar a usar ecrãs, tanto
maior será o tempo de vida em que se está exposto à luz azul, pelo que “os
possíveis problemas associados poderão aparecer mais cedo”.
“Sabe-se
que a interacção da luz azul com as células da retina pode levar à morte dos
foto-receptores e embora o organismo tenha mecanismos para lutar contra isso,
vai perdendo a habilidade para o fazer com o tempo”, refere o especialista. Uma
das consequências pode ser o aparecimento antecipado de degenerescência macular
da idade (DMI), uma doença incurável da retina, mais comum a partir dos 50 ou
60 anos de idade e que pode levar à perda de visão.
Apesar de
haver cada vez mais investigação sobre a relação entre a luz azul e a saúde
ocular, António Morais adverte que “ainda não há certezas a médio e a longo
prazo, mas tudo aponta para que seja uma relação complicada e nefasta”.
Todavia, alerta que a luz azul não é para banir totalmente, já que “tem grande
influência no nosso relógio biológico, nomeadamente, nas horas de sono”.
Miopia aumenta no
mundo
Também a
miopia tem vindo a ser associada à utilização prolongada de ecrãs electrónicos,
uma vez que o aumento de ambas as situações parece coincidir. Num estudo
publicado em 2016 sobre a prevalência deste problema, estima-se que o mesmo
venha a afectar cerca de metade da população mundial em 2050.
A miopia
consiste numa anomalia ocular que se traduz por má visão à distância, o que
leva os especialistas a considerar que quem passa muitas horas a focar ao perto
(olhando para ecrãs) poderá ficar progressivamente menos capaz de acomodar a
visão para ver correctamente ao longe. António Morais lembra também que “a industrialização
da sociedade e o aumento do tempo passado dentro de quatro paredes em situações
de distâncias curtas pode ter influenciado a prevalência da miopia nos tempos
modernos”.
Como prevenir?
A SVC
tem sido bastante estudada, remontando a 2005 um artigo científico publicado
na Survey of Ophthalmology com a sua caracterização, dando a
conhecer o problema à comunidade médica. Luz adequada, utilização de filtros,
posição ergonómica e pausas regulares foram logo nessa altura algumas das
cautelas sugeridas para reduzir os incómodos causados pela SVC. Estas medidas
preventivas são também reforçadas por António Morais [ver infografia], que
considera “muito importante” o despiste de qualquer situação, recomendando que
“se visite regularmente um especialista de visão”.
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