O seu filho está distraído nas aulas? Então talvez seja indisciplinado
Inquérito a professores mostra que a
maioria considera que a responsabilidade da indisciplina na escola é dos pais.
Mais de 60% recorrem à expulsão da sala. Investigador diz que tem que se lidar
com o problema “no local que ocorre e não em casa”.
25 de
Fevereiro de 2018, 8:29
A maioria dos professores inquiridos
refere que nas suas aulas há pouca indisciplina NUNO FERREIRA SANTOS
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Estar distraído na sala de aula é um comportamento de indisciplina? Um
inquérito a que responderam 2348 professores mostra que mais de 80% consideram
que sim e que esta é aliás a situação de indisciplina que apontam como mais
frequente na sala de aula.
Este inquérito, a que o PÚBLICO teve acesso, foi feito online pelo autor do
blogue sobre educação ComRegras, o professor de Educação Física Alexandre
Henriques, e os seus resultados podem também ser consultados a partir deste
domingo naquela plataforma.
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Sobre as situações de indisciplina que mais ocorrem nas salas de aula, os
docentes foram confrontados com 20 hipóteses, que oscilam entre os alunos
estarem distraídos (86,6%) e a agressão física aos professores (0,6%). No
pódio, a seguir à distracção aparece a “interrupção das aulas com comentários
despropositados”, “brincarem/fazerem palhaçadas”, “agredirem verbalmente
colegas”, “entrarem e saírem das salas aos gritos e empurrões” ou “utilizarem
sem autorização aparelhos tecnológicos”.
Apesar desta pormenorização, o presidente da Associação Nacional de
Directores de Escolas e Agrupamentos Públicos (ANDAEP), Filinto Lima, ressalva
que como “distracção se deve entender a perturbação frequente das aulas por
parte de alunos que, por exemplo, também distraem os outros com palermices”.
Já Jorge Ascenção, presidente da Confederação Nacional das Associações de
Pais (Confap), considera que o facto de os professores considerarem que
distracção é indisciplina ilude aquela que deveria ser a “questão principal”.
“Se estão distraídos por que é que isso acontece e o que se pode fazer para que
não seja assim?” — questiona, lembrando a propósito estudos internacionais
que dão conta desta característica dos alunos portugueses: gostam da escola,
mas não das aulas.
Amentar
O professor da Universidade do Minho João Lopes, que tem vários trabalhos
sobre indisciplina na escola com base em entrevistas a docentes, dá conta que
também tem verificado que “a ‘distracção’ é, de longe, o comportamento
perturbador mais referenciado pelos professores”.
A este respeito lembra que, sendo a distracção um comportamento bastante
normal entre os humanos, esta tende a ser maior nas salas de aula entre “os
alunos com poucas competências para acompanharem a matéria que está a ser
dada”.
A pequena indisciplina
Apesar das queixas sobre o mau comportamento dos alunos serem recorrentes,
a maioria dos inquiridos (64%) considera que nas suas aulas há “pouca
indisciplina” e 67,3% dizem o mesmo quando se pergunta sobre a sua escola em
geral e não só na sala. Esta é uma percepção que vai ao encontro das queixas
que os directores reportam ao Ministério da Educação e que baixaram drasticamente
nos últimos anos: o número total de ocorrências participadas baixou de 1321, em
2013/2014, para 422, em 2016/2017.
Aumentar
Alexandre Henriques não deixa, contudo, de se manifestar surpreendido pelo
facto de “dois terços dos inquiridos terem referido que há pouca indisciplina”,
até porque, lembra, os dois inquéritos anteriores que
realizou a directores, em 2016 e 2017, davam conta da existência de um número
muito elevado, todos anos, de ocorrências nas escolas. “Hipoteticamente
falando, podemos estar perante a banalização da pequena indisciplina. O que no
passado era inaceitável, hoje em dia pode ser rotina”, afirma. Mas também há
outra possibilidade, admite: “Podemos estar perante uma melhoria dos índices de
indisciplina em Portugal.”
E o que fazem os professores perante as situações de indisciplina nas suas
aulas? Das 12 hipóteses apresentadas, uma é usada por todos, “advertir com
calma”, embora a frequência com que o fazem varie (ver infografia). Quase 93%
dos professores referem que alteram a sua metodologia de ensino, 83,8% mandam
recados para casa e cerca de 63% optam pela ordem de saída da sala de aula.
Sobre esta última opção, Filinto Lima garante que “só é usada quando
anteriormente foram utilizadas outras estratégias, que não resultaram”. E
refere ainda que com estes alunos mais indisciplinados o problema, “geralmente,
vai muito para além da escola”, o que leva a outra percepção generalizada entre
os professores. Quando questionados sobre os factores que poderiam diminuir a
indisciplina, o mais votado (86,2%) foi este: “maior
responsabilização/penalização dos pais”.
“Este descartar de responsabilidades deixa-me triste”, comenta Jorge
Ascenção. O presidente da Confap admite que há culpas que podem ser atribuídas
a algumas famílias, mas frisa que neste alijar de responsabilidades, tanto por
parte das escolas, onde os alunos passam a maior parte dos seus dias, como
também de pais, “as vítimas continuarão a ser os jovens”.
“Os encarregados de educação não podem desligar o telefone a um professor,
faltar às reuniões, mentir nas justificações de faltas e tudo isso acontece.
Justifica-se por isso uma certa revolta e frustração por parte dos
professores”, comenta Alexandre Henriques.
Filinto Lima defende que as “responsabilidades devem ser repartidas”. “Os
pais não devem desvalorizar a escola e as escolas têm de encontrar estratégias
para cativar estes alunos a quem a escola muitas vezes nada diz”, refere.
João Lopes deixa uma advertência: “Esta atribuição da indisciplina nunca
alterará a situação, já que esta questão tem que ser lidada no local onde
ocorre (sala de aula) e não em casa”. Por outro lado, refere, quando 72% dos
inquiridos apontam a “formação parental” como outro dos principais
factores que poderão diminuir a indisciplina, fica evidenciado “o quanto os
participantes atribuem esta a factores externos à sala de aula”. “Como, na
verdade, jamais conseguirão formar pais, a estratégia está condenada ao
fracasso”, avisa.
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